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ANS não deseja venda obrigatória de plano individual

saúde - 22/03/2022

Para destravar a venda dos planos individuais, artigo raro na prateleira das operadoras, Paulo Roberto Rebello Filho, presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), topa discutir um assunto caro para o consumidor: a limitação de reajuste destes contratos.

Sem dar detalhes, diz que não se trata de uma liberação geral, mas que é preciso abrir uma discussão que permita que esses planos voltem a ser ofertados.

Expectativa para o aumento de 2022

“Há um aumento de Custo Brasil, insumos encarecendo, há aumento na sinistralidade (uso do plano), mas não é comparável ao que andam dizendo (empresas falam em reajuste recorde). Este ano, vai ter reajuste positivo. Se fala em período eleitoral, mas a ANS é uma agência de Estado e não de governo.'

'A minha maior defesa é a aplicação da fórmula, a mesma que deu resultado negativo em 2021 (queda de 8,19%, a primeira redução já registrada). O dado encontrado será o divulgado.”

Modelo de reajuste do plano coletivo

“A ANS tem avançado em razão da transparência nos cálculos de reajustes e valores que são apresentados pelas empresas.'

'Temos um olhar especial aos hipossuficientes, que são os contratos individuais e os que têm até 30 usuários, e monitoramos os coletivos, mas não há pretensão de estabelecer um percentual de reajuste para esses contratos. Mas coibir abusos, nós já fazemos.”

Oferta de planos individuais

“A agência tem que estimular cada vez mais a concorrência. A gente precisa entender quais são os entraves do plano individual, de que forma podemos estimular a venda. Uma coisa de que não abro mão é do veto à rescisão unilateral do contrato, não se pode dar essa possibilidade (de cancelar) à operadora.'

'Até sobre o reajuste a gente pode conversar. Não estou dizendo que vou liberar o reajuste do individual, as pessoas vão me matar. Mas não se vai obrigar a vender plano individual por decreto. A agência tem que estar aberta a esse tipo de discussão.”

Julgamento sobre cobertura obrigatória

“Na visão da ANS, o rol sempre foi taxativo (só prevê cobertura obrigatória para o que está listado). Caso seja considerado (em julgamento pelo STJ) exemplificativo (que pode se estender de acordo com futuras interpretações) será um retrocesso muito grande. '

'Voltaríamos à época anterior à regulação. Como estimar riscos que serão cobertos por uma operadora? Qual o preço que vai ser de cada produto? Isso vai aumentar a judicialização, e a ANS não vai ter precisão de suas ações regulatórias. Havia a crítica de demora na incorporação de procedimentos, mas a ANS vem modernizando o rol, reduzindo prazos de atualização, mantendo análise permanente. É um ponto que pode sensibilizar os ministros do STJ que estão para decidir esse caso.”

O que motiva a judicialização no setor

“Tem duas situações: aquele beneficiário que procura o Judiciário em razão do descumprimento de alguma previsão contratual, e aí tem que brigar mesmo e procurar a agência, e tem o consumidor querendo alguma tecnologia ou procedimento extra rol.'

'O fato é que ninguém se debruçou para fazer uma análise mais aprofundada sobre os dados dos tribunais para que a gente pudesse saber o que de fato está acontecendo e atuar. É um ponto em que quero avançar.”

Transferência da carteira da Amil para APS

“O primeiro movimento feito no fim do ano passado foi a transferência (dos planos individuais) da Amil para a APS, que é do grupo, e ela cumpriu todo o fluxo.'

'Ao longo desse processo, no entanto, foi divulgado na imprensa que a UnitedHealth sairia do país, houve alguns movimentos na rede credenciada e aumentaram as reclamações. Mandamos um ofício para saber a capacidade da APS e um outro, mais incisivo, pedindo informação sobre o UnitedHealth e aí veio resposta vaga, dizendo que havia sigilo.'

'Para regulador não existe sigilo. Em razão disso suspendemos a transferência de cotas na Junta Comercial de São Paulo, que estava em vias de acontecer. Os documentos só foram entregues nesta terça-feira e estamos analisando.”

Debate sobre adoção do Open Health

“Dentro da agência a gente já tem algo parecido que é o Guia ANS de planos. Desde 2009, essa ferramenta permite que o consumidor verifique a possibilidade de fazer portabilidade baseada em seus dados cadastrais e compare os planos das operadoras.'

'Essa iniciativa (Open Health) veio do laboratório de inovações do BC, e a lógica bancária é diferente da de saúde, tem uma cabeça que se pode oferecer uma mensalidade menor a quem está bem de saúde e isso não dá, pois haveria seleção adversa, expulsão de idosos e doentes crônicos. Da forma como está sendo feita não tem como, precisamos sentar à mesa e avançar.”

Impacto da pandemia para operadoras

“Em março de 2020, ninguém conseguia saber qual seria o impacto da pandemia no setor. Com o lockdown, a redução de renda, achava-se que a inadimplência ia aumentar, haveria saída em massa para o SUS.'

'A agência trabalha com monitoramento, mas estava enxergando, em março, informações de 2019, os dados ainda estavam por chegar. Começamos a solicitar informações mais simples, baseadas no fluxo de caixa das operadoras, para entender o reflexo da pandemia nas empresas e tomar decisões.'

'Cobrava-se muito que liberássemos ativos garantidores, fizéssemos flexão de prazos, acabamos sendo conservadores. E hoje a história demonstra que estávamos certos. As pessoas deixaram de procurar os prestadores (hospitais e laboratórios) e caiu o uso, as operadoras ganharam quase dois milhões de novas vidas, houve um número maior de portabilidade para planos mais baratos, mas a inadimplência se manteve na série histórica. O cenário que foi pintado não se concretizou.”

Informações mensais sobre a Covid no país

“A ANS sai fortalecida e muito mais transparente. Foi uma virada de chave, já tinha um processo de transparência na agência, mas o Boletim Covid (que traz informações mensais sobre a pandemia) foi um grande incentivador para que pegássemos os nossos dados e transformássemos em painéis dinâmicos que podem ser consultados pelo consumidor, fazendo com que os usuários fiquem mais empoderados, possam tomar melhores decisões e promovendo concorrência.”

Segmentação de planos

'Está dentro da agenda regulatória a questão do acesso, a agência está disponível para discutir o assunto, mas a gente tem que amadurecer melhor essa ideia.'

'Na Constituição diz que o beneficiário precisa ter a prevenção, promoção e a recuperação, todo e qualquer produto que for ofertado tem que estar de olho na linha de cuidado do paciente. Ele não pode ser deixado perdido nessa jornada. Todos que vierem nesse escopo eu aceito discutir.'

Custo do setor

'Tem desafios estruturais nesse setor. Há um aumento frequente de custos, determinado por novas tecnologias, a própria mudança da estrutura etária da população.'

'Hoje a lógica do setor é centrada na doença e é preciso mudar esse modelo. A operadora precisa deixar de ser uma intermediadora financeira e passar a compreender que a sua função é ser a gestora do cuidado do beneficiário. Não adianta segmentar se não mudar a perspectiva de gestão.'

Concentração de mercado

'Embora haja um movimento de concentração, o Brasil ainda é o país com o maior número de players no mercado comparado com qualquer país do mundo.'

'A concentração em si, eu acho que a gente tem que olhar caso a caso, porque há benefícios, ganho de escala, ganho de eficiência, há benefícios que acontecem. Temos olhado essa questão, estamos analisando, mas de fato a concentração pela concentração a meu ver não é ruim. O movimento que deve perdurar por algum tempo, tem espaço para haver esse movimento até o momento sem prejuízo do consumidor final. '

Fonte: O Globo