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Mercado de seguros se prepara para deslanchar
Desempenho - 21/03/2011
A aposentada Jussara Ferreira Melo nunca tinha pensado em contratar um seguro de vida até o mês passado. Com a pensão e o que ganha como artesã, calculava ser um investimento alto demais para o benefício que poderia oferecer. Até que uma amiga recém-segurada falou sobre as vantagens e as parcelas relativamente pequenas que assumira. Comecei a me interessar. Se algum problema me impedisse de trabalhar, teria uma renda garantida , observa. Poucas semanas depois, procurou um corretor e contratou uma apólice dentro de sua real necessidade por um preço dentro de seu orçamento. É uma segurança para mim e minha família .
Tal como dona Jussara, muitos brasileiros estão começando a se interessar em conhecer e contratar diferentes tipos de seguros. Nos últimos anos, o Brasil ingressou em um momento favorável à comercialização de apólices para pessoas físicas e jurídicas. Com a economia apresentando bom desempenho, o emprego estável e a renda em alta, muitas pessoas passaram a adquirir automóveis, imóveis e eletrodomésticos, contratando cobertura ou garantia estendida para proteger o patrimônio, ou reservam parte do orçamento para apólices de vida e saúde.
O crescimento anual do setor tem se situado na casa de 14% nos últimos seis anos. Além da melhoria da situação econômica do País, fatores como a Copa do Mundo de 2014, as Olimpíadas de 2016 e as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) atingem positivamente a venda de seguros também na área corporativa, com a garantia de proteção para as grandes obras. O crescimento do País beneficia diversas áreas da economia, e o mercado de seguros é bastante favorecido por este cenário , explica Murilo Durigan, gerente de projetos do International Business Communications (IBC), que promoverá nos dias 13 e 14 de abril, em São Paulo, o Insurance Summit 2011, evento no qual empresários e executivos debaterão o futuro do mercado de seguros no País.
A estimativa é que o setor ultrapasse sua participação de 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), registrada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) em 2010, para 6% na metade desta década isto, é claro, se os preços das apólices não dispararem em decorrência do desastre no Japão.
A catástrofe pode causar um impacto negativo no mercado de seguros, com alta nos preços das apólices que cobrem os grandes riscos, como obras de aeroportos, rodovias, ferrovias, setor naval e propriedades industriais cobertas complementarmente pelas companhias internacionais de resseguros. Como o mercado é interligado globalmente, o prejuízo no Japão poderá respingar no consumidor brasileiro.
Especialistas apontam que os preços de apólices para pessoa jurídica começarão a subir dentro de 90 dias, quando ficará mais claro o tamanho das perdas no país asiático. As proteções à pessoa física também poderão encarecer, uma vez que a tábua atuarial (método usado para calcular riscos e expectativa de vida da população) será alterada mundialmente. Vimos a mesma situação quando o furacão Katrina atingiu Nova Orleans, em 2005, afetando o mercado de seguros em escala global , observa Marco Pontes, diretor da consultoria LG&P Advisory Services.
Enquanto avalia as consequências do terremoto, o mercado aposta no crescimento econômico e na consolidação de uma consciência coletiva quanto à importância de proteger seu patrimônio. Quanto melhor a economia, maior é o potencial do desenvolvimento do mercado de seguros, com mais pessoas com dinheiro no bolso e disposição para contratar as mais diferentes apólices , destaca Júlio César Rosa, diretor-presidente do Sindicato das Seguradoras no Rio Grande do Sul (Sindseg-RS).
Comparação com o desempenho global deixa claro que o Brasil ainda tem um enorme potencial em seguros. Os negócios do setor ainda são relativamente pequenos no País, em comparação aos países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a participação dos seguros na economia chega a 8,9% do PIB, e na França, a 10,3%.
Uma das explicações a esta distância está na concentração dos tipos de seguros procurados pelos brasileiros. Em geral, a população consome seguros de automóvel e planos de vida e previdência privada estes na maioria das vezes contratados coletivamente por empresas ou entidades de classes. E só. Seguros para saúde, habitação, responsabilidade, patrimônio ou acidentes pessoais ainda não estão arraigados nos hábitos da população, e custam a gerar grandes volumes de negócios. Cientes das oportunidades e dos desafios que o mercado oferece, as seguradoras passam a colocar seu foco em grupos potenciais para consumir cada tipo de serviço. Um dos públicos-alvo é formado por profissionais com boa remuneração e estabilidade, como médicos e funcionários públicos.
Além de serem facilmente identificados pelas profissões, possuem uma renda mensal alta, o que lhes possibilita comprar mais apólices de vida e residencial, por exemplo. Os seguros de automóveis chegaram ao limite; as seguradoras estão procurando explorar o potencial de outras categorias com um público que pode pagar por estas coberturas , explica Jorge Luiz Fett, superintendente da Comercial Confiança Companhia de Seguros. Para conquistar esse nicho, a empresa tem desenvolvido um processo de comunicação mais próximo e claro com clientes e corretores, apresentando o custo-benefício de cada produto, e se aproxima cada vez mais de entidades representativas. O outro grupo sob a lupa das seguradoras é composto por pessoas das classes C e D, cujo ritmo de crescimento nos últimos anos é vertiginoso em função da melhora nos índices de emprego e renda. Neste caso, cabe a venda de garantia estendida ou seguros prestamistas , observa Fett. Os seguros prestamistas são aqueles que quitam as parcelas de bens adquiridos em caso de morte ou invalidez do segurado, desobrigando a família a devolver o bem à loja ou quitá-lo.
É a chamada nova classe média a consumidora preferencial de seguros populares oferecidos por grandes redes de varejo e operadoras de telefonia móvel e fixa, que massificam as ofertas através de seus meios de cobranças regulares. Estas empresas têm a vantagem de contarem com pagamentos mensais dos potenciais clientes, diminuindo as despesas com estruturas de vendas e cobranças, assim como a inadimplência. Composto por 150 seguradoras, o mercado nacional movimentou mais de R$ 124 bilhões em 2010. Neste período, pagou aproximadamente R$ 35 bilhões em indenizações.
Além de terem diante de si um cenário macroeconômico favorável, as seguradoras que vendem apólices de vida têm se tornado mais competitivas em preços. Recentemente, foi anunciada uma mudança na forma de mensurar a expectativa de vida da população brasileira, determinada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi). A alteração resultou em uma fórmula que barateou de 10% a 15% o valor do seguro de vida para homens e mulheres na faixa dos 40 anos, justamente o segmento que mais consome esse tipo de produto no País.
Na categoria de pessoas, os seguros envolvem uma massa expressiva de clientes em potencial, por isso é apontada pelas empresas e entidades como as mais promissoras para os próximos anos. Além dos planos individuais, hoje as empresas têm inserido seus empregados em seguros coletivos, inclusive para se prevenirem de danos e prejuízos em decorrência de acidentes. Algumas categorias, como bombeiros ou trabalhadores da construção civil, já têm apólices específicas às suas peculiaridades.
Os seguros de vida, as previdência privadas e os planos de saúde ainda são ofertados principalmente em massa, através de contrato com empregadores , explica Solange Beatriz Palheiro Mendes, diretora-executiva da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSeg). Mas nos últimos anos estes benefícios têm se tornado um objeto de desejo dos brasileiros, e a procura individual cresce rapidamente , aponta.
Estes fatores impactam diretamente na venda de seguros de vida e previdência. A modalidade é uma das que mais cresce no País. Dados da Fenaprevi mostram que a arrecadação da previdência privada aberta bateu a marca de R$ 46 bilhões em 2010, com incremento de 18,8%. O volume da carteira de investimentos aumentou 21,9%, chegando a R$ 223 bilhões.
O segmento já conta com 12 milhões de contratos, sua participação na arrecadação total da indústria de seguros saltou de 21% em 2001 para 37% em 2010. Toda arrecadação nestas operações já causa uma elevação do total de recursos, informa Marco Antonio Rossi, presidente da Fenaprevi. O total de estoque de previdência privada aberta, que atualmente soma R$ 223,6 bilhões, já equivale a 6% do PIB , revela.
Dentro da categoria vida, um grande potencial de crescimento, na opinião de Júlio César Rosa, do Sindseg-RS, é a previdência complementar, que responde a apenas 16,3% de participação dentro da categoria vida , enquanto VGBL domina 57%.
Os seguros residenciais ainda estão longe de crescer como poderiam no Brasil, em função de serem equivocadamente associados por potenciais clientes ao seguro do automóvel. O senso comum costuma supor que uma pessoa que paga R$ 2 mil por ano por um seguro de um automóvel avaliado em R$ 40 mil pagará o proporcional por um imóvel de R$ 200 mil, por exemplo.
Na verdade, o seguro para habitações, assim como para patrimônio residencial e empresarial, tem seu valor calculado de forma diferente do automobilístico, uma vez que está sujeito a outros tipos de riscos. Proporcionalmente ao valor do bem, este tipo de proteção é bem mais barata.
A desinformação atrapalha a fortificação deste mercado: o seguro habitacional representa apenas 1% do mercado, mesmo que casas e apartamentos sejam os patrimônios mais importantes de uma família. Trata-se de um entrave ao desenvolvimento de um setor represado, diante do crescimento explosivo do mercado da construção civil na última década.
Também há um potencial gigantesco ainda adormecido para os seguros patrimoniais, que envolvem riscos de engenharia e proteção a escritórios ou parques industriais. Com a aceleração da construção de estradas, pontes e ferrovias e reformas de portos e aeroportos prometidos para os grandes eventos esportivos que virão adiante, bilhões de reais em proteção prometem circular entre seguradoras e resseguradoras nos próximos anos. O desastre no Japão também deverá servir de alerta quanto à importância de assegurar imóveis, obras e parques industriais.
A venda de seguros patrimoniais já vinha com uma boa perspectiva, e, diante dos acontecimentos recentes no Japão e mesmo no Brasil, em eventos como a enchente em São Lourenço do Sul (RS), no início de março, crescerá acima de 40% nos próximos cinco anos , projeta Júlio César Rosa, do Sindseg-RS.
Com as mudanças em torno do Instituto do Resseguro do Brasil, em 2009, entraram no País 90 resseguradoras internacionais, firmando parcerias no mercado brasileiro e oferecendo possibilidades diversas para a construção pesada. Desta forma, não faltará recursos para a oferta de seguros.
O Projeto de Lei que criará o microsseguro, atualmente tramitando no Congresso Nacional, é visto pelas corretoras e seguradoras brasileiras como um possível propulsor de mercado. O microsseguro será uma forma de levar a proteção aos consumidores de baixa renda, apresentando-os, inclusive, às alternativas mais robustas de cobertura já existentes.
Os microsseguros deverão vender proteções para itens de valores baixos, oferecendo também um prêmio menor. Serão seguros por prazo certo, com operações rotativas, garantias de operação de crédito em função de sinistro, garantias estendidas etc. Alguns destes produtos já são vendidos pelas empresas varejistas em parcerias com as seguradoras, mas não podem ser considerados microsseguros por serem ofertados atrelados a outras compras.
As corretoras já começam a se preparar para estas novas oportunidades. Equipes de vendas estão sendo treinadas para melhorar seu processo de comunicação para atender aos consumidores menos informados.
Também já desenvolvem projetos de novas categorias de seguros a serem contratados pela população de baixa renda.
O microsseguro terá subsídios, comissão inferior ao corretor e isenção parcial de Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF). Serão vendidos por canal de vendas, grêmios e sociedade beneficente por preços de 30% a 40% menores do que os seguros convencionais. Será um modelo de seguro para baixa renda comercialmente viável, o que hoje ainda inexiste no Brasil , diz Júlio César Rosa, do Sindseg-RS.
Com a conquista da baixa renda, seguros já solidificados nas classes média e alta poderão também ser apresentados aos clientes menos endinheirados. Entretanto, o setor alega ser necessária uma revisão na legislação no que tange às exigências documentais para contratação de novas apólices, de forma a viabilizar a penetração a novas massas de consumidores.
Os seguros populares, em particular, sentem muito as exigências burocráticas para a comercialização de seus produtos, que muitas vezes exigem documentação que não contribui para esclarecer a situação do cliente , explica Solange Beatriz Palheiro Mendes, diretora-executiva da CNSeg. E isto inviabiliza muitas vendas . De acordo com a dirigente, a Susep tem se mostrado receptiva às demandas do setor.
Na área de automóveis, por exemplo, mudanças reivindicadas passam por alterações na legislação para venda para automóveis com mais de 20 anos de uso equivalentes a um quarto da frota.
Estes veículos encontram seguros muito caros, diante da dificuldade em se encontrar no mercado peças originais, cuja utilização por parte das seguradoras é uma obrigação legal.
Fonte: Jornal do Commercio - RS