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Cultura estatal é origem da atual crise do IRB

resseguro - 10/03/2020

A falta de transparência e a inabilidade na relação com investidores foram os fatores que geraram a crise reputacional pela qual o IRB passa atualmente, afirmam analistas.

Segundo eles, tais questões se assemelham uma cultura estatal, inerente a empresas que eram controladas pelo governo e que não melhoraram suas práticas durante o processo de abertura de capital.

Só nesta quinta-feira (5), foram a maior queda do Ibovespa, com recuo de 16,17%, cotada em R$ 15,97. No ano, as ações registram retração de 59%.

Um executivo do mercado de capitais afirmou que o mercado ficou negativamente impressionado com a empresa desde o começo de fevereiro.

Na época, a gestora Squadra publicou duas cartas afirmando que o IRB estaria publicando, em seus resultados, lucros recorrentes inferiores aos contábeis. Pouco tempo depois, no final do mês, o então presidente do conselho de administração da resseguradora, Ivan Monteiro, renunciou ao cargo.

A desconfiança do mercado aumentou quando, na semana passada, saiu notícia no mercado de que o presidente e o vice-presidente financeiro do IRB supostamente teriam passado informações erradas para a imprensa e para analistas de que a Berkshire Hathaway, holding de investimentos do megainvestidor Warren Buffet, teria triplicado sua posição na resseguradora.

A oscilação nos papéis decorrente dessa notícia, fizeram com que a própria holding soltasse um comunicado negando a participação no IRB. Como consequência, as ações do IRB derreteram.

O executivo do mercado de capitais afirmou, ainda, que grande parte da percepção dos investidores foi de que, apesar da venda da participação majoritária do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal no ano passado, o IRB ainda tem uma cultura estatal, e isso teria levado à crise que a companhia enfrenta desde fevereiro.

Caixa vendeu a sua fatia de 8,9% em fevereiro de 2019 e o Banco do Brasil se desfez da sua, de 15,2%, em julho.

Segundo o analista da Guide Investimentos Henrique Esteter, existem estatais com gestões eficientes e é difícil generalizar, mas as más escolhas do IRB foram sentidas pelo mercado.

“Não é nem uma falta de transparência, mas é uma falta de verdade”, afirma.

Mesmo entre os próprios funcionários da resseguradora, a percepção é que os bancos públicos continuam sendo o veículo de controle estatal na empresa, que foi privatizada em 2013.

“A privatização nós mesmos às vezes colocamos entre aspas”, diz o presidente do Sintres (Sindicato dos Trabalhadores em Resseguros do Estado do Rio de Janeiro), Carlos Alberto Cruz.

Ele ressalta que, embora os maiores acionistas seja bancos privados, o governo federal sempre manteve influência por meio da escolha de executivos e membros do conselho de administração.

Para substituir Ivan Monteiro, egresso do Banco do Brasil, na presidência do conselho – ele deixou o cargo em fevereiro alegando questões de saúde –, foi escolhido o presidente da Caixa, Pedro Guimarães.

No lugar de José Carlos Cardoso, então presidente da companhia, e de Fernando Passos, vice-presidente financeiro, está Werner Süffert, da BB Seguridade.

Cardoso e Passos renunciaram nesta quarta (4) após as notícias de que teriam passado informações erradas sobre a participação da Berkshire Hathaway no IRB.

O novo comando do IRB anunciou nesta quinta-feira (5) que não descarta revisar as projeções da companhia para 2020 e que acabou com os bônus por valorização da ação a executivos. Afirmou também que vai investigar as circunstâncias exatas da divulgação de informações relativas à sua base acionária pela companhia.

Para Esteter, da Guide, a escolha dos executivos está mais ligada ao nome de peso que carregam no mercado segurador do que necessariamente relacionada à empresa de onde vieram.

“Para que a confiança na empresa volte, são necessários nomes conhecidos pelo mercado, que tenham passado por grandes empresas e que se demonstrem fidedignas ao cargo. E o conselho sabe disso. Será preciso alguém capacitado para a retomada dos papéis do IRB”, disse.

O analista da Planner Corretora Victor Martins, afirma que, de qualquer forma, a empresa foi penalizada pela sua falta de transparência.

“Se a mensagem [da teleconferência desta quinta-feira] foi passada, ou ela não foi plenamente entendida pelo mercado ou ainda há uma desconfiança inerente dos últimos acontecimentos. IRB ainda precisa recuperar a credibilidade e não é algo que será fácil ou rápido”, afirma.

Fonte: Folha de São Paulo